A esta altura, você já dever ter lido em revistas de
negócio uma daquelas típicas matérias contendo receitas infalíveis de como ser
um profissional mais bem-sucedido ou um líder melhor no ano que se inicia.
Mesmo que superficiais, elas sempre ajudam no mínimo a agendar uma reflexão
tantas vezes adiada na correria do dia a dia. Mas, para além das dicas técnicas
e comportamentos recomendados que certamente você já anotou em sua agenda de
2012, gostaria de acrescentar, a título de nova reflexão, um recado menos
óbvio: o exercício da solidariedade fortalece a musculatura do seu potencial de
liderança.
Acabo de voltar de Barcelona, onde tomei contato com um estudo muito
interessante feito por Nicola Pless e Thomas Maak, professores da Esade
Business School, uma das mais importantes escolas de negócios do mundo. Pless e
Maak entrevistaram 70 executivos dos EUA, América Central, Europa e Sudeste
asiático, todos eles integrantes de um programa de desenvolvimento de liderança
da Pricewaterhouse Coopers, chamado Ulysses.
Os participantes são estimulados a trabalhar durante dois meses em projetos na
Namíbia, Quênia, Camarões, Zâmbia, Madagascar e Gana e não há lucro em jogo.
No
lugar de construir negócios, eles são desafiados a colocar conhecimento e
talento a serviço de causas como a redução da pobreza, saúde e preservação
ambiental.
Sem os times remunerados e as estruturas montadas com que costumam
contar nas companhias, eles têm de agir com apoio de ONGs, empreendedores
sociais e organizações internacionais.
A principal conclusão geral dos pesquisadores
O contato direto com situações de pobreza transforma profundamente o estilo de
gestão dos líderes e melhora substancialmente suas habilidades de liderança, de
tal modo que eles retornam à empresa muito melhores.
Os resultados chamam a
atenção.
Para 95% dos integrantes, participar de um programa
como esse implica enorme ganho de conhecimento a respeito de temas
socioambientais e de saúde. Nove em cada dez (91%) deles afirmam ter saído da
experiência mais conscientes da grande responsabilidade de executivos de
empresas frente aos dilemas socioambientais do mundo; e 85% entendem que se
tornaram líderes mais flexíveis, empáticos e sociáveis na medida em que
melhoraram suas habilidades interpessoais e de comunicação.
E mais: 82% dos executivos entrevistados admitem que
viver os desafios de um País em desenvolvimento os tornou líderes mais
sensíveis para a importância das relações e das amizades.
Ainda na mesma linha
de raciocínio aquisitivo, surpreende o fato de que mais da metade (54%) diz ter
reduzido preconceitos e aprendido a evitar julgamentos sobre pessoas. Eis aí
uma competência emocional importante.
Segundo a professora Nicola Pless, o estudo indica que, no retorno à empresa,
todos os participantes se mostram socialmente mais responsáveis, respeitosos e
tolerantes. Além disso, também desenvolveram determinadas atitudes de
liderança, com nova postura ética, valores mais fortes e uma mentalidade
global.
Experiências de trabalho em equipe em países pobres impactam direta e
profundamente o autodesenvolvimento.
“Os líderes envolvidos tornam-se mais conscientes de suas limitações pessoais e
suas necessidades de desenvolvimento. Aprendem a ser humildes, encontram um
propósito de vida mais profundo, ficam mais conscientes da importância das
relações e sentem maior necessidade de equilibrar trabalho com vida pessoal.”
As conclusões desse estudo espanhol confirmam uma convicção antiga. No meu
livro “Conversas com Líderes Sustentáveis: o que aprender com quem fez ou está fazendo
a mudança para a sustentabilidade” (SENAC-SP, 2011) ressalto que líderes
empresariais têm muito a aprender com outros líderes que enfrentaram, com
sucesso, desafios nos campos social e ambiental.
O que se vê hoje
Não por acaso, tenho observado dois fenômenos curiosos e até certo ponto
surpreendentes. Com a inserção do conceito de sustentabilidade na gestão dos
negócios, cada vez mais as empresas começam a recrutar para seus quadros os
profissionais que estavam a serviço de seus institutos e fundações, porque
enxergam neles competências de liderança como as descritas no estudo da Esade
Business School, crescentemente mais valorizadas.
Cada vez mais, líderes de negócios importantes começam a enviar seus jovens
executivos à linha de frente do relacionamento com comunidades, para que eles
aprendam a conviver com opiniões contrárias, a lidar com conflitos, a ouvir os
pontos de vista dos públicos impactados pelos negócios e a se colocar no lugar
dessas pessoas.
Se você ainda não pensou nisso, é hora de pensar.
Ricardo Voltolini é diretor-presidente de Ideia Sustentável: Estratégia e
Inteligência em Sustentabilidade e idealizador da Plataforma Liderança
Sustentável (www.ideiasustentável.com.br/lideres )
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