Brian Fernandez tem 49 anos,
trabalha com construção civil e mora em Orillia, uma cidade da província
canadense de Ontario com pouco mais de 30 mil habitantes. É, em suas próprias palavras, uma pessoa comum vivendo uma vida
comum.
No entanto, graças a uma postagem descompromissada que publicou em seu perfil no
Facebook - rede na qual tem 423 amigos -, Brian provocou uma
reviravolta no mercado alimentício de uma nação na qual catchup está presente
em mais de 80% das residências.
Fernandez publicou, em 23 de fevereiro, a foto de um pote de catchup da marca
French's. Elogiou seu sabor e comentou que o produto era livre de
conservantes. Mas, mais importante, ressaltou que se tratava de um catchup
fabricado com tomates cultivados por agricultores canadenses, citando que
a Heinz, marca mais conhecida do segmento, havia fechado sua fábrica na cidade
de Leamington, deixando 740 pessoas desempregadas. Brian concluiu seu post dando um singelo adeus à marca que
antes consumia:
"Bye. Bye. Heinz."
O relato de
Brian tomou rumos inesperados para alguém que não possuía uma rede
expressiva de contatos online: em apenas três dias, seu post recebeu mais
de 102 mil compartilhamentos no Facebook e inspirou diversas campanhas online
de boicote aos produtos da Heinz.
A repercussão nas redes sociais também
fez com que sua postagem chamasse a atenção da mídia: até o presente
momento, mais de 200 jornais, sites e blogs reverberaram a história. O
resultado foi um impacto imediato nas vendas da French's: os estoques do seu
catchup simplesmente acabaram em diversos supermercados canadenses.
A história de Brian, que já
tem sido reconhecido nas ruas de sua cidade como "the ketchup guy",
acaba por valer algumas reflexões a respeito de toda a repercussão catalisada
pelas mídias sociais:
1. A capacidade de
influenciar independe de números quantitativos.
A rede de contatos de
Fernandez no Facebook é constituída por pouco mais de 400 pessoas; se
dependesse só desses números, ele jamais seria considerado
um influenciador. Porém, graças à relevância dos conteúdos que
compartilhou, criou uma mensagem que se alastrou feito fogo em palha seca nas
mídias sociais.
2. A criação de um conteúdo
relevante passa por uma boa pesquisa de informações
Em entrevista que concedeu ao jornal National Post, Brian
comentou que, ao encontrar catchups da marca French’s - muito mais
conhecida por suas mostardas - em um supermercado, ficou curioso e decidiu
fazer uma pesquisa na internet a fim de saber se valeria experimentar a
novidade, já que sempre comprava catchups da Heinz. Foi aí que descobriu que a
Heinz havia fechado sua fábrica em Leamington, no interior de Ontario,
desempregando 740 pessoas. E que a French's assumiu posteriormente essa mesma
fábrica, produzindo seus catchups com tomates cultivados no Canadá. Se Brian
não tivesse feito essa pesquisa, não teria se deparado com estas informações
nem escrito o post que acabou por ganhar repercussão mundial.
3. Na era das mídias
sociais, pessoas consideram mais a voz de um consumidor do que de corporações
ou instituições tradicionais
A notícia de que a French's
começou a produzir catchups feitos com tomates canadenses foi veiculada em
janeiro deste ano e anunciada tanto na mídia comono site da empresa. No entanto, só teve impacto real nas
vendas graças a um post no Facebook publicado por um consumidor comum.
4. Toda empresa precisa ter
uma estratégia de comunicação digital para gerenciamento de crises
Não foi uma matéria de TV ou
reportagem de revista que fez com que fosse deflagrada por todo o Canadá uma
campanha de boicote aos produtos da marca Heinz. Foi a internet,
com seu poder de disseminação viral, que tem causado prejuízos sérios à imagem
da Heinz no país.
O pior é que o problema
não foi de falta de tempo para planejar ações. Afinal, a fábrica da Heinz
em Leamington, inaugurada em 1909, foi fechada em junho de 2014. E, enquanto o prejuízo em
redes sociais se alastra desde o final de fevereiro, até agora nem o site
da marca nem sua fanpage canadense se manifestaram. Foi o prefeito
de Leamington, John Paterson, que precisou declarar que, apesar de ter descontinuado sua
produção de catchups, a Heinz ainda ajuda a manter cerca de 400 empregos na
cidade através da fabricação de outros itens da marca, como vinagre, suco de
tomate e molho de macarrão.
É difícil entender como uma
marca do porte da Heinz não se preocupou em sequer colocar em prática algum
plano de gerenciamento de crises. E justamente no Canadá, país no
qual está presente há 105 anos e
que apresenta o segundo maior consumo per capita de catchups no mundo.
5. Monitoramento online é o
mínimo que uma empresa precisa fazer na internet
Não, uma empresa não precisa
estar em todas as redes sociais criando perfis oficiais em sites e aplicativos
como LinkedIn, Snapchat, Twitter ou Facebook. Suas estratégias em mídias
sociais dependerão do seu ramo de atuação, do público-alvo de suas marcas e
serviços e da adequação de acordo com a sua missão e valores corporativos.
Porém, em um cenário no qual seus clientes e consumidores em potencial
participam ativamente da grande conversa de mesa de bar das redes sociais,
compartilhando críticas, sugestões e elogios referentes aos produtos e marcas
que consomem, é cada vez mais importante aproveitar todo esse manancial de
informações, especialmente nestes tempos de big data.
Uma marca como a Heinz, que
está bombando negativamente no boca a boca online, precisava no mínimo
acompanhar as repercussões do post de Brian e dar uma resposta às campanhas
online de boicote dos seus produtos, em vez de se omitir esperando que surjam
espontaneamente manifestações como a do prefeito de Leamington.
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Alexandre Inagaki é
jornalista, consultor de comunicação em redes sociais e autor do blog Pensar Enlouquece, Pense
Nisso. http://pensarenlouquece.com/
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