Para algumas pessoas, recusar um pedido ou mesmo impor
limites nas relações é uma tarefa complicadíssima. E não sem motivo. “Desde a infância,
somos incentivados a nos esforçar para socializar com os outros. Num misto de
solidariedade e compromisso, aprendemos a estar sempre à disposição”, explica
André Faro, da Universidade Federal de Sergipe.
Neste cenário, declinar do que quer que seja vai contra
os ensinamentos incorporados e ainda desperta o medo de magoar. “É comum
acreditar que ao dizer ‘não’ vamos decepcionar o outro e até perder o seu
afeto”, diz a psicóloga Marina Vasconcellos. “Para muita gente, aceitar tudo é
uma condição para manter relacionamentos, ser amada e aceita”, completa Faro.
Por outro lado, fica mais fácil impor a própria vontade
quando se está seguro em uma relação.
Isso explica porque muitas vezes é mais fácil recusar um
pedido dos pais do que do parceiro ou parceira. “Você sabe que mesmo com brigas
e discussões, a família sempre será mais tolerante. As chances de perder o
afeto e a atenção do cônjuge são bem mais reais”, pondera Herculano Campos, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Bonzinho, sem ser bobo
No ambiente profissional é mais comum engolir mais sapos,
porque o funcionário pode ser mal visto ao recusar um trabalho ou pedido de um
colega. “Em todos os outros tipos de relação, no entanto, o receio de dizer
‘não’ simplesmente não deveria existir”, diz Marina. Nesses casos, a gentileza,
a amizade e a solidariedade são realmente qualidades louváveis, mas não ao
custo da autoanulação, ou seja, da supressão das próprias vontades e ideias
para agradar. “É importante relevar algumas coisas e atender aos desejos do
outro, mas não o tempo inteiro”, reforça.
Aceitar, de pronto, todos os pedidos alheios costuma
provocar um sentimento de frustração. “As pessoas se arrependem de dizer “sim”
e depois são atormentadas por aquele mal-estar por um tempo”, afirma Faro. “É
preciso ter em mente que qualquer relação precisa de limites, pois, além da
amizade, do amor e da camaradagem, a individualidade do sujeito está em jogo”
completa ele. Já quem consegue ser assertivo, equilibrando “sim” e “não”, em
geral, vive mais feliz. “Aquela pessoa muito boazinha nem sempre é a mais
valorizada. Posicionar-se é uma forma de mostrar ao mundo que você faz escolhas
sobre a própria vida e que exige que elas sejam respeitadas”, garante Marina.
Respeito e gentileza evitam conflitos
Diante de qualquer pedido que cause incômodo ou
mal-estar, peça um tempo para pensar antes de responder. Uma dica é analisar as
consequências do que vai dizer. “Se aceitar, qual é o impacto que você provocará
no outro? Isso vai ajudar a reforçar a imagem positiva que ele tem de você?
Qual é o preço que você terá que pagar por isso? Vale a pena?”, questiona
Herculano Campos. O psicólogo garante que, muitas vezes, o clima chato que se
instaura depois do “não” dura menos do que o sentimento negativo que faz o
indivíduo se remoer por dentro, ao perceber que contrariou as próprias
vontades.
No entanto, para se impor, não é preciso agredir ou
ofender. “Todo tipo de conteúdo pode ser transmitido de diversas formas e até
uma recusa pode ser acompanhada de uma atitude de respeito pelo outro e de uma
boa dose de gentileza”, diz Marina. Também fica mais fácil aceitar e
compreender um “não” que vem amparado por uma justificativa honesta e delicada.
“Para justificar a recusa, basta mostrar que as perspectivas divergem, sem
querer ditar o que é certo e o que é errado”, ensina Faro.
Agora, é preciso estar preparado para casos em que a
negativa seja mal interpretada, apesar de todos os cuidados. “Não sabemos com
clareza se a outra pessoa entenderá nosso ponto de vista. Quem pede algo com a
certeza de que será atendido tende a ficar mais incomodado diante da negativa”,
avisa o psicólogo. “No entanto, se após as explicações o outro permanecer
irredutível a ponto de mudar a maneira de se relacionar, cabe uma avaliação
sobre a relevância desta amizade. Afinal, num relacionamento saudável, todos
devem ter a liberdade de se expressar e de se colocar”, finaliza.
Por Marina Oliveira e Thaís
Macena, UOL
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