Trabalho em equipe não é sinônimo de trabalho sem chefe
As necessidades de desenvolver o trabalho em equipe e a
diminuição de níveis hierárquicos lançaram na confusão uma empresa que atendi
há cerca de um ano. Nas palavras do diretor que nos procurou para pedir ajuda:
"Ninguém mais quer saber de obedecer a ordens, todos se acham autônomos para
tomar decisões. E, se buscamos repreender essas atitudes, ouvimos um discurso
pronto sobre empreendedorismo interno, valorização da equipe, horizontalidade
da empresa. Muitas vezes, isso acaba em demissão. Criamos um monstro!"
Monstro, mesmo, tive de concordar. Estava claro que
havia uma grande deformação dos conceitos e das práticas de trabalho em equipe
e horizontalidade na empresa. O pressuposto: no trabalho em equipe, todos devem
decidir, e a própria figura do chefe deixa de fazer sentido. É um pressuposto
falso mas que pode prosperar estimulado pelas próprias chefias.
O que pode ocorrer é que, após um processo de
reorganização gerencial, as chefias fiquem inseguras a respeito de seu próprio
papel e enfatizem tanto a necessidade de compartilhar responsabilidades que
acabam negando sua própria função. Do outro lado, muitos profissionais vêem
nesse novo ambiente uma chance para mostrar seus talentos e ganhar espaço.
Viram -- ou tentam virar -- verdadeiros tratores. E, assim, o que era para ser
um cenário de colaboração vira uma guerra de projetos pessoais e de
competitividade predatória.
Nosso trabalho, no caso que mencionei, foi o de
reverter essas distorções. A chave para isso foi a compreensão de que trabalhar
em equipe não significa nivelar todos os profissionais: há atribuições
específicas, regras e subordinações que não podem ser destruídas. É certo que
ocorrem mudanças nos procedimentos e nas formas de trabalho, mas isso não quer
dizer que cada um pode decidir o que bem lhe aprouver.
Essa compreensão deve partir das chefias. O trabalho em
equipe não significa que o chefe deixa de existir -- na verdade, ele se torna
mais importante do que nunca. Mas, diferentemente de um modelo autoritário,
esse chefe não manda, ele decide. A equipe enfrenta os problemas, propõe
soluções, encontra novos caminhos. O chefe atua como mediador do processo. Cabe
a ele decidir entre as opções existentes, definir os melhores cronogramas,
bater o martelo a respeito de uma determinada inovação. Todos têm espaço e
palavra, mas ele tem a última palavra.
O trabalho com essas questões permitiu que as chefias
daquela empresa deixassem de ser reféns do processo de modernização. Num
primeiro momento, isso levou alguns a uma postura autoritária: por insegurança,
haviam adotado um discurso democratizador no qual não acreditavam e agora
queriam voltar à posição de poderosos chefões. Alguns não tinham perfil para
funcionar no novo modelo e acabaram substituídos. A maioria, no entanto,
evoluiu na compreensão de seu papel. Com isso, os próprios chefes passaram a
difundir essa compreensão em suas equipes.
Ensinar, mediar os processos de discussão e decidir (em
lugar de mandar) -- tudo isso faz parte do perfil da chefia no trabalho em
equipe. Se você ocupa uma posição de comando ou se sua empresa está em fase de
modernização, tenha isso em foco. Ou vai ficar enlouquecido entre a tentação de
ser um ultrapassado executivo autoritário ou um tímido executivo que não
consegue mais ver a utilidade da sua própria posição.
Artigo de autoria de Simon M. Franco, publicado na
Edição 804 da Revista EXAME
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