sexta-feira, 28 de agosto de 2015

O menino mágico e o empresário

Jorge estava cansado das dificuldades financeiras, da burocracia estatal, da queda nas vendas, da injustiça que é ser empresário em um território hostil de inacreditável regime trabalhista e tributário. Empregava mais de trezentos funcionários e cada vez mais sentia-se pressionado e inquieto com a corrupção epidêmica. Não era assim que aprendera com seu pai, um homem ético e visionário, cujo destino abraçou-o cedo demais. Afundou-se na poltrona da biblioteca pensativo sem saber o que fazer para sair da situação que mais se parecia com o fundo do poço. Em algum momento o furor do sucesso havia sido corrompido pelo medo do fracasso, e, assim o negócio familiar caminha para uma recuperação judicial.
Então, ouviu o tamborilar de passos pequenos, uma respiração leve chegou a ele. Sorriu, deveria ser sua filha. Porém quando a porta abriu, às três da manhã, era um menino, algo em torno dos nove anos, vestido com uma capa preta de estrelas, chapéu alongado e uma varinha de plástico na mão. Quem é você?, perguntou, para receber de volta uma resposta que o surpreendeu: "Sou mágico, um menino mágico".
Jorge ficou imóvel, estaria sonhando? O garoto deu uma risada curta e com um truque fez aparecer uma chave com aparência antiga e desgastada. Venha comigo, o menino disse, preciso lhe mostrar algo. Desceram por uma escada que não existia, não em sua casa. Estou sonhando?, perguntou-se.
"Quem é você? Não tenho tempo para brincadeira!", falou com uma rispidez maior do que gostaria, mas o menino apenas apontou para as portas.
Eram três portas talhadas em madeira com desenho de folhas rústicas. Pegue a chave, Jorge. E assim ele fez. Sentiu uma pontada no coração, pois lembravam exatamente as portas da casa do avô, o primeiro empreendedor da família. Ficou sem palavras.
O menino apresentou cada uma delas e o empresário repetiu mentalmente. A da esquerda se chama "impossível", a do centro "possível" e a da direita é a porta "segurança".
Cada uma delas tem um poder específico, faça a sua escolha.
Ponderou sobre a representação de cada escolha. Olhou novamente para o garoto, e isto o fazia ficar tranquilo. Amanhã nada vou lembrar mesmo, pensou, é um sonho, não existe magia neste mundo, aqui é tão somente um tempo fraturado. Mesmo assim, continuou o jogo.
Girou a chave na porta impossível. Seu queixo caiu, porque havia um espelho e viu que ele era o menino mágico. E depois, a através do espelho outros meninos da mesma idade e cada um disse o nome: Charles Chaplin, Santos Dumont e Bartolomeu de Gusmão. Os quatro foram brincar de arte, de avião, de balão e por fim do ponto que os unia: o impossível! Uma simples palavra que fora o motor propulsor das invenções e das pequenas e grandes revoluções. Ele redescobriu que coisas possíveis foram feitas do impossível, de homens e mulheres que acreditaram mais do que outros.
Então compreendeu tudo e levantou-se da poltrona num pulo. Algo fazia pulsar o seu coração mais rápido. Compreendeu que o menino mágico sempre estivera próximo, mas pela seriedade do mundo ele o esquecera em algum canto da memória.
Jorge descobriu que a crise, é, antes de tudo, uma questão de perspectiva. A dele havia mudado. O seu menino mágico lhe provou que empreender é uma aventura e, como se sabe, existem os riscos, os acidentes, as quedas e a redenção, mas acima de tudo, havia a grande jornada.
E, por ela, valia a pena.
Rodrigo Bertozzi 

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