terça-feira, 7 de junho de 2011

Incompetência gerencial em minha vida

Por Roberto A. Santos
O Prof. Robert Hogan, psicólogo norte americano, especialista em Psicologia da Personalidade e Liderança que já citei em artigos anteriores, estima que 55% a 65% dos gestores são incompetentes. Obviamente, esta sua declaração foi amplamente rechaçada no início, mas quando as pessoas fazem suas próprias avaliações acabam por concordar com ele. Exceto por aqueles muito afortunados ou que ainda não tiveram muitos chefes.
De fato, costumamos encontrar muito mais literatura sobre as incompetências gerenciais do que o oposto. Atualmente, pode-se encontrar sites que permitem à comunidade das vítimas de "chefes-mala-sem-alça", trocarem dicas sobre como lidar com eles ou elas. Existem fóruns de discussão, dicas de leitura e até a possibilidade de um exorcismo virtual do chefe para deleite vingativo dos sofredores.
Numa postura científica, eu também fiz uma retrospectiva de minhas experiências com chefes diretos e indiretos, ao longo de minha carreira de 27 anos como empregado de grandes empresas. De fato, aquela estimativa do Dr. Hogan se confirmou. Eu também tive oportunidade de conhecer um número maior de incompetentes do que de bons líderes.
Certamente, aprendi muito com meus modelos positivos de liderança. No entanto, também recebi ótimos ensinamentos dos chefes-mala, valise ou sacola, alguns até sem fundo. Neste sentido, o exemplo negativo daqueles desprovidos de alça, também me ajudou muito a forjar meu estilo de liderança. Vamos começar com estes exemplos de incompetência didática:
1) Prá que mexer nisso se está funcionando...
Um de meus chefes costumava proferir essa típica frase assassina de idéias. Aquele que usa esta linguagem tem tendência a ser um "serial killer" de criatividade e das iniciativas de melhoria contínua por parte de seu pessoal. Muitas vezes, ele ou ela o faz por preguiça ou por insuficiência intelectual e técnica. Até o dia em que o mundo todo à sua volta deixar de funcionar para ele e tem que procurar outro emprego. Às vítimas deste "desalçado", meu conselho: não desanimem e continuem sugerindo, propondo e criando pois vocês acabarão encontrando terrenos mais permeáveis a sua energia criativa.
2) Se algo puder sair errado, certamente vai sair pior ainda...
Parodiando uma das famosas Leis de Murphy, o chefe que a segue, é acometido de ceticismo e pessimismo crônicos, tão arraigados, quanto aqueles da hiena "Hardy Har-Har" dos desenhos animados. Quem poderia se esquecer? "Oh Céus, Oh Dia, Oh Azar... Acho que isso não vai dar certo". O problema, neste caso, não é a preguiça ou a incompetência técnica, mas a preferência pela zona de conforto ilusória que acredita usufruir por não correr riscos. Geralmente, este chefe está sempre muito bem amparado por explicações inteligentes e técnicas de porque tudo não vai funcionar. Sofrem o pessimista e sua vítima. Esta, luta incessantemente para tentar provar que se acreditarmos e fizermos o melhor possível, algo pode dar muito certo. O chefe Hardy que não se desvencilha dessa postura negativa, acaba realizando a profecia de tudo realmente vai dar errado, mas em sua própria carreira.
3) Se o chefe lhe pedir feedback, cuidado!
Um de meus mestres negativos de gestão e liderança, certa vez, me pediu um feedback sobre uma apresentação que estávamos fazendo em conjunto. Imbuído da maior boa vontade e espírito construtivo, esmerei-me em dar-lhe um feedback simples, preciso, fundamentado do (pouco) que estava bom e sobre o que poderia melhorar. Para meu choque de neófito, ele retrucou que detestava feedbacks. Aprendizagem: se você não tiver certeza de que seu chefe definitivamente não seja um "mala", talvez seja melhor falar-lhe apenas o que espera ouvir. Com o tempo, todos os espelhos sociais o estarão enganando: "Sim! Você é o melhor chefe do reino!" até que algum rei o demova para bobo da corte.
4) Apoiar e estimular não significa evitar um "não" necessário...
Mesmo um de meus modelos de liderança positiva me ensinou por uma atitude negativa. Em sua ânsia de motivar e estimular as iniciativas e idéias, este chefe constantemente adiava decisões temendo um impacto negativo sobre minha motivação. Resultado, acabava gerando apenas dúvidas e frustrações. Precisamos muito mais de um "não" claro e bem fundamentado do que a falsa expectativa de uma aprovação que nunca vem, por mais bem intencionada que seja. Felizmente, esta pessoa era muito especial e, diferente do citado acima, e pôde receber e incorporar o feedback que lhe dei a esse respeito.
5) Cerque-se de sua patota para se proteger do chumbo grosso!
Outro mestre negativo que tive é daquele que muda de empresa e logo se cerca de sua patota para perpetuar a admiração comprada anteriormente em outras frentes. Seus fiéis e subservientes escudeiros tornam-se os olhos e ouvidos do rei, ainda que muitas vezes míopes ou com sua audição filtrada por aquilo que o chefinho gostaria de ouvir. Incompetentes são os chefes que não tentam aprender a trabalhar com as diferenças. Piores ainda são seus "capachos" que suportam todo o barro do outro - até que, em algum momento, a quadrilha se desfaça pela força externa.
6) Nunca compre o julgamento de uma pessoa vindo de outra.
Também aprendi com um de meus chefes incompetentes que nunca se deve assumir como verdade uma avaliação que ouvimos sobre uma terceira pessoa, por maior que seja a veracidade que se tenta transmitir. Quando alguém tenta nos "preparar" para lidar com alguém dito difícil, está apenas buscando cúmplices para sua incapacidade de se relacionar com a outra pessoa. Superando a tentação de assumir a visão pessoal de outros, damos uma chance real para um relacionamento positivo começar, sem as lentes distorcidas pela incompetência alheia. 

Em minha vida profissional, devo uma palavra de gratidão a estes gestores incompetentes que ajudaram a formar meu conceito do que não deve ser um líder por sua exímia habilidade de desmotivar e estressar seus colaboradores. Como diz um amigo que adora trocadilhos: "Há males que vem parabéns!." 
Agora vou abordar aquilo de positivo que pude aprender com alguns gestores que tive durante minha carreira. Nem sempre esses ensinamentos são visíveis ou intencionais; mais freqüentemente, são posturas, comportamentos, atitudes que ensinam por si mesmas, sem necessidade de um púlpito. Talvez, estas lições sejam as mais verdadeiras e duradouras que possamos receber e transmitir.
1) Antes de ser promovido pela empresa, você já se promoveu a si mesmo. (o pleonasmo é proposital...)
Aprendi com um chefe que, geralmente, a empresa prega as divisas de oficial de patente mais alta apenas naqueles que já estão agindo como tal. Você é promovido a gerente quando já vem agindo como tal. A promoção de direito costuma vir depois que o profissional, de fato, já havia se promovido pelo seu desempenho e competências. O segredo do bom gestor é estar atento para estas demonstrações e não distraído por processos burocráticos ou por pressões daqueles que não conseguem se promover de fato.
2) Nenhuma empresa tem o direito de fazer com que seus colaboradores voltem para casa humilhados, inseguros, doentes...
O gestor positivo é responsável por sua equipe. Se por um lado, seus resultados dependem da somatória sinérgica dos talentos que a compõem, cabe-lhe zelar pela capacidade de produção desses resultados. Esta capacidade depende de um ambiente livre do tensões fabricadas, de ameaças, incertezas e inseguranças, etc. Cabe manter sempre abertas suas portas, ouvidos, mentes e seus corações para dissipar os males que estão a seu alcance fazê-lo.
3) Gestão é uma arte para algumas pessoas mas a ciência contribui muito para apoiar os dons artísticos.
A velha discussão de liderança ser inata ou aprendida, além de embolorada, já não acirra muitas reflexões. Acredito firmemente que algumas características de personalidade sejam mais favoráveis ao exercício de cargos de gestão de outras pessoas, porém, líderes muito positivos se desenvolvem mesmo não tendo todas essas características. Seu segredo está em seu caráter de humildade, integridade e perseverança, e em muito estudo e dedicação, para entender as pessoas e como administrar as diferenças entre elas.
4) Nenhuma empresa é uma família...
Pode parecer muito bonita e altruísta a comparação de uma empresa como família, mas um de meus verdadeiros líderes, me ensinou outra coisa. Se você não tiver certeza de que jamais terá que demitir alguém da empresa que gerencia, então não a chame de família. Afinal, não se demite irmãos de uma família... A preocupação autêntica com os colaboradores de uma empresa não depende de considerá-los "parte da família". Devemos tratá-los como parte do time. Enquanto estiverem jogando bem e fazendo gols, terão lugar garantido no campo ou no banco de reservas. A demagogia pode até ter espaço na política, mas nas empresas tem efeito negativo sobre sua imagem e sobre a retenção dos verdadeiros talentos. O que as pessoas esperam é serem geridas por princípios sólidos, uma coerência entre discurso e ação e uma genuína atenção aos problemas dos indivíduos.
Aos modelos positivos que temos o privilégio de conviver em nossas vidas, devemos mais do que simples palavras de gratidão. A estes, devemos um compromisso de deixar um legado de outros exemplos positivos para a formação de outras pessoas. Além disso, relembro que nós aprendemos não apenas com nossos gestores (competentes ou não) mas também com nossos colegas, subordinados e clientes.
Como um eterno aprendiz do ofício de trabalhar com pessoas devo gratidão aos toques e feedbacks que recebi e espero continuar recebendo de todos os cantos e canções, como "In My Life" dos Beatles que me inspirou para escrever este artigo.



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