As pessoas que mais aprendem são as que mais ensinam.
Até mesmo a forma como elas buscam o aprendizado é um ensinamento para nós.
Quem culpa a falta de tempo por não fazer aquele curso tão importante para sua
ascensão profissional talvez não saiba que Lincoln tornou-se advogado estudando
sozinho, nas raras horas livres que seu trabalho braçal lhe permitia. Os que
afirmam não terem “condições adequadas” para aprender provavelmente ignoram o
fato de que Marie Curie arriscou a liberdade e a vida para poder estudar. Os
que dizem que “é tarde demais para aprender” possivelmente desconhecem a
história de Roberto Marinho. Quem está sempre declarando: “Nunca vou conseguir
aprender isso”, talvez começasse a pensar diferente se ouvisse a história de
Alcino Neto. E os profissionais preocupados apenas com o conhecimento
necessário aos aspectos técnicos de suas carreiras teriam muito a ganhar se
pensassem a respeito da máxima de Willard Rockwell: “Desenvolva tanto o homem
quanto o gerente”.
Cora Coralina tem uma frase muita sábia: “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina”. É curioso notar ela não diz “ensina o que sabe”, mas, sim, “transfere”. Quem pensa em termos de “ensinar o que sabe” pode estar se colocando na posição de um professor na sala de aula, sem o ser. E, ainda por cima, pode estar se colocando na posição de um mau professor, que se envaidece ao exibir de forma arrogante o conhecimento que acumulou.
Por outro lado, quem transfere o que sabe não está preocupado em “dar lições”, mas em partilhar. Pessoas assim não fazem questão de ser admiradas: fazem questão de ser úteis. Ao transferir o que sabem, elas não estão impondo suas crenças, seus métodos e seus valores aos demais. Os que transferem o que sabem reconhecem e respeitam esse direito, pois entendem que nenhum conhecimento pode ser verdadeiramente assimilado e colocado em prática sem antes ser digerido, elaborado e re-elaborado por aquele que o recebe. Na prática, essa é a diferença entre um chefe de família que obriga os filhos a pensar como ele e um pai que respeita e orienta a forma de pensar dos filhos. É a diferença entre um chefe que obtém resultados medíocres ao impor seus conceitos de modo autoritário e um líder que se compraz ao ver suas idéias florescerem e se desenvolverem ao serem assimiladas por seus funcionários.
A segunda parte da frase de Cora Coralina fala em “aprender o que ensina”. Ao nos colocarmos na posição de ensinarmos alguma coisa, precisamos estar atentos a tudo que ainda podemos aprender com aquilo que achávamos que já sabíamos. Posso citar como exemplo minha própria experiência como palestrante. Por mais que eu conheça o assunto sobre o qual vou falar, por mais que já tenha feito a mesma palestra dezenas de vezes, nunca deixo de aprender alguma coisa nova a cada palestra que dou. A interação com o público, a troca de opiniões, as perguntas e observações que surgem sempre acrescentam algo a mais, sempre somam algo novo àquilo que eu achava que já sabia.
Há uma pequena história que eu costumo contar no início de minhas palestras. Quando minha filha tinha três anos de idade, nós morávamos em uma rua movimentada e perigosa. Cada vez que nosso portão era deixado aberto por algum descuido, minha filha saía correndo e atravessava a rua para chegar à casa de uma amiga que morava na calçada em frente. Preocupados com a situação, eu e minha esposa decidimos ensinar à pequena como atravessar a rua com segurança. Assim, da próxima vez que, aproveitando-se de algum descuido, ela tentasse escapulir, pelo menos estaria sabendo como lidar com os perigos da rua. “Primeiro você para na calçada”, disse-lhe eu. “Depois, olha para cima e para baixo, e só então atravessa”, expliquei. Como a rua era uma ladeira, eu achei que tinha deixado bem claro que os carros poderiam estar subindo ou descendo e que, portanto, era necessário olhar em ambas as direções. Dias depois da lição, minha filha aproveitou-se do fato de que o portão fora acidentalmente deixado aberto e saiu correndo. Fomos atrás dela, mas não conseguimos alcançá-la a tempo. Com o coração apertado eu a vi parar junto ao meio-fio, olhar para o céu, olhar para o chão e atravessar a toda velocidade. Por sorte, nada lhe aconteceu. Mas, passado o susto, minha esposa e eu concluímos que nossa filha havia feito exatamente o que lhe ensinamos: olhou para cima (para o céu), e para baixo (para o chão). Ela entendeu a mensagem de acordo com seu conhecimento e com sua forma de ver o mundo. Nós, por outro lado, a ensinamos da maneira que nos parecia ser a mais óbvia, sem pararmos para pensar de que modo ela poderia estar compreendendo isso.
Nesse exato momento, quantos chefes, gerentes e funcionários mais velhos não estão fazendo o mesmo? Quantos por aí não estão culpando seus colaboradores por “não fazer o que lhes foi ensinado”, sem pararem para pensar que o problema talvez esteja na forma como o ensinamento foi transmitido?
Paulo Kretly
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