Voltando de uma reunião com um cliente, em meio a uma série de coisas para
fazer, abri meu Outlook para ver os e-mails.
Uma rápida passada de olho, deletando os spans e buscando as prioridades,
encontrei uma mensagem reflexiva de minha amiga Alice.
Apesar de estar com pouco tempo e de não ser o melhor momento para ler
e-mails que não fossem de ordem profissional, algo me inspirou à leitura…
O texto, escrito pelo Rabino Nilton Bonder. Talvez o fato de não professar
a fé judaica e tanto pouco conhecer o rabino fosse mais um motivo para desistir
da leitura. Mas, algo continuava me inspirando a “perder” esse tempo.
Li, reli e decidi transcrevê-lo aqui em sua íntegra.
O texto é longo, demorado, toma tempo, especialmente se fizermos uma pausa
para refletirmos sobre cada frase, cada contexto.
Mas, acho que vale a pena “nos presentearmos com esse tempo”…
“Para um mundo no qual funcionar 24 horas por dia parece não ser suficiente.
Onde o meio ambiente e a terra imploram por uma folga, onde nós mesmos não
suportamos mais a falta de tempo, descansar se torna uma necessidade do
planeta.
Hoje, o tempo de ‘pausa’ é preenchido por diversão e alienação.
Lazer não é mais feito de descanso, mas de ocupações para não nos ocuparmos.
A própria palavra entretenimento indica o desejo de não parar.
E a incapacidade de parar é uma forma de depressão.O mundo está deprimido
e a indústria do entretenimento cresce nessas condições. Nossas cidades se
parecem cada vez mais com a Disneylândia.
Longas filas para aproveitar experiências pouco interativas. Fim do dia
com gosto de vazio. Um divertido que não é nem bom e nem ruim.
Dia pronto para ser esquecido, não fossem as fotos e a memória de uma
expectativa frustrada que ninguém revela para não dar o gostinho ao próximo.
Entramos neste milênio em um mundo que é um grande shopping. A internet e
a televisão não dormem. Não há mais insônia solitária; solitário é quem dorme.
As bolas do Ocidente e do Oriente se revezam fazendo do ganhar e do
perder, das informações e dos rumores, atividade incessante. A CNN inventou um
tempo linear que só pode parar no fim.
Mas as paradas estão por toda a caminhada e por todo o processo.
Sem acostamento, a vida parece rápida e eficiente, mas ao custo fóbico de
uma paisagem que passa.
O futuro é tão rápido que se confunde com o presente.
As montanhas estão com olheiras, os rios precisam de um bom banho, as
cidades de uma cochilada, o mar de umas férias, o domingo de um feriado…
Nossos namorados querem ‘ficar’ trocando o ‘ser’ pelo ‘estar’.
Saímos da escravidão do século XIX para o leasing do século XXI… Um dia
seremos nossos?
Quem tem tempo não é sério, quem não tem tempo é importante. Nunca fizemos
tanto e realizamos tão pouco.
Nunca tantos fizeram tanto por tão poucos…
Parar não é interromper. Muitas vezes continuar é que é uma interrupção.
O dia de não trabalhar não é o dia de se distrair, literalmente, ficar desatento.
É um dia de atenção, de ser atencioso consigo e com sua vida.
A pergunta que as pessoas se fazem no descanso é: ‘o que vamos fazer
hoje?’ – já marcada pela ansiedade.
E sonhamos com uma longevidade de 120 anos, quando não sabemos o que fazer
numa tarde de Domingo.
Quem ganha tempo, por definição, perde. Quem mata tempo, fere-se
mortalmente. É este o grande ‘radical livre’ que envelhece nossa alegria, o
sonho de fazer do tempo uma mercadoria.
Em tempos de novo milênio, vamos resgatar coisas milenares. A pausa é que
traz surpresa e não o que vem depois. A pausa é que dá sentido à caminhada.
A prática espiritual deste milênio será vivar as pausas.
Não haverá maior sábio do que aquele que souber quando algo terminou e
quando algo vai começar.
Afinal, por que o Criador descansou? Talvez, porque mais difícil do que
iniciar um processo do nada, seja dá-lo como concluído”.
Dominar o próprio tempo e não ser escravizado por ele, eis aí um bom
desafio…
Por Flávio Lettieri
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