Paulo Roberto Teixeira
Seleção. Dizem que
é uma "escolha fundamentada". Baseada em fundamentos os mais
diversos. Técnicas são aprimoradas. Atualmente, figura a tal "seleção por
competências". Muito provavelmente outras técnicas vão surgir. Mas todas
elas aprimoram a dimensão mensurável do ato de selecionar pessoas. Ainda que
nosso foco seja nas "competências", "habilidades",
"valores" e por aí vai, não tem jeito, seleção é escolher pessoas; e
pessoas em sua totalidade. A divisão é uma mera tentativa de quantificar alguns
aspectos. Tentativa! Inadvertidamente, a intuição apreende o resto. O mais
importante? Não sei. Este artigo é apenas um convite à reflexão, e não uma
resposta. Por se tratar de pessoas, a intuição é tão presente quanto a
existência concreta do candidato e do selecionador num processo seletivo.
A seleção de
pessoal aprimora-se continuamente. Ainda bem. Mescla de ciência e arte, muitas
vezes imprime no candidato a imagem (e alguns dizem que é a mais importante)
que ele terá daquela organização que lhe está avaliando. De fato, todos já
estão convencidos disto. Porém, desconfio que a tal "imagem" que o
profissional-candidato leva da empresa contratante não é tão atrelada à
precisão técnico-científica do processo seletivo, mas sim à postura, à
abordagem, à empatia e, claro, à respeitabilidade que o profissional de seleção
apresentou ao longo do processo. Tão importante quanto conduzir com maestria
uma entrevista ou aplicar um teste, é abordar o candidato com respeito,
cordialidade, interesse e, me perdoem os cientistas, leveza de espírito.
Leveza de espírito.
Conceito aparentemente abstrato. E parece abstrato, de fato, justamente devido
à dificuldade de materializá-lo em palavras. Ou talvez porque caibam tantas
palavras que, por mais que sejamos prolixos, sempre faltará algo. Mas a tal
leveza de espírito é ação, é existência material, é tão concreta quanto esta
tela de computador ou esta folha de papel. A atmosfera na qual ocorre um
processo de seleção é naturalmente tensa. Seleção nada mais é que avaliação.
Avaliar é atribuir valor. É atribuir valor a coisas muito pessoais,
individuais, subjetivas até. Num processo mais tradicional, há duas pessoas
numa sala: um que entrevista (que avalia) e outro que é entrevistado
(avaliado). Por mais descontraído que seja, trata-se de um momento que sempre
carrega alguma tensão, algum desconforto, sobretudo para o candidato. Alguém
está "dando notas", atribuindo valor às minhas competências, às
minhas atitudes, aos aspectos da minha subjetividade e, inevitavelmente, aos
meus princípios pessoais.
Leveza de espírito.
Demonstrar interesse pelo candidato e suas histórias. Surpreender-se. Frustrar-se
junto com ele. Sentir e pressentir. Sorrir com facilidade. Refletir suas
expressões. Compreensão antes de explicação. Não se deixar seqüestrar por
preconceitos, mas deixar "em cima da mesa" suas intuições.
Pois é:
"deixar em cima da mesa" suas intuições. Não adianta, ainda que
vivamos numa sociedade que nos petrifica, ainda somos humanos (não sei até
quando, mas ainda somos...). Pressentimento, intuição, fenômenos que,
inevitavelmente, fazem parte da nossa relação com o mundo. E, sobretudo, nas
relações humanas. Há aqueles que nos dizem para jogar fora os pressentimentos e
as intuições, como se estas coisas fossem algum tipo de fraqueza; como se as
coisas que pressinto e intuo de nada servissem, pois a verdade deve vir tão
somente da racionalidade, da técnica, do método.
Sei não. Tenho medo
das certezas. Defendo que a intuição é legítima. Num processo de seleção, assim
como em todas as relações humanas, ela está presente e deve fazer parte do
conjunto das nossas conclusões. Há de se tomar muito cuidado para não
utilizá-la como pretexto que justifica preconceitos. Por isto, conclamo: leveza
de espírito. Preconceito é um negócio pesado. Afunda como âncora e nos deixa
imóveis, amargos, míopes. Nada disso tem a ver com a intuição.
O que sinto e
pressinto de meu candidato deve ser levado em conta, porque antes de ser
profissional, sou gente. Antes do teste e da entrevista, tem meu olhar. E tudo
isto em seu conjunto, em sua inter (e intra) relação, ao final do processo,
forma um retrato falado daquele candidato. Sim, retrato falado: uma tentativa
de ilustrar a face de alguém. Algumas coisas são certas. Outras são erradas.
Mas enfim, um retrato - ainda que falado - precisa ser feito. Mas é ilusão
pensarmos que para fazer este retrato é necessário somente o aprimoramento
técnico. Seleção envolve necessariamente relação humana. E um melhoramento
efetivo só ocorre, de fato, com um melhoramento afetivo: o profissional de
seleção tem que gostar de pessoas.
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