sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Seleção e Intuição

Paulo Roberto Teixeira Junior (Consultor da Visão RH – Unidade Campinas)

Seleção. Dizem que é uma "escolha fundamentada". Baseada em fundamentos os mais diversos. Técnicas são aprimoradas. Atualmente, figura a tal "seleção por competências". Muito provavelmente outras técnicas vão surgir. Mas todas elas aprimoram a dimensão mensurável do ato de selecionar pessoas. Ainda que nosso foco seja nas "competências", "habilidades", "valores" e por aí vai, não tem jeito, seleção é escolher pessoas; e pessoas em sua totalidade. A divisão é uma mera tentativa de quantificar alguns aspectos. Tentativa! Inadvertidamente, a intuição apreende o resto. O mais importante? Não sei. Este artigo é apenas um convite à reflexão, e não uma resposta. Por se tratar de pessoas, a intuição é tão presente quanto a existência concreta do candidato e do selecionador num processo seletivo.
A seleção de pessoal aprimora-se continuamente. Ainda bem. Mescla de ciência e arte, muitas vezes imprime no candidato a imagem (e alguns dizem que é a mais importante) que ele terá daquela organização que lhe está avaliando. De fato, todos já estão convencidos disto. Porém, desconfio que a tal "imagem" que o profissional-candidato leva da empresa contratante não é tão atrelada à precisão técnico-científica do processo seletivo, mas sim à postura, à abordagem, à empatia e, claro, à respeitabilidade que o profissional de seleção apresentou ao longo do processo. Tão importante quanto conduzir com maestria uma entrevista ou aplicar um teste, é abordar o candidato com respeito, cordialidade, interesse e, me perdoem os cientistas, leveza de espírito.
Leveza de espírito. Conceito aparentemente abstrato. E parece abstrato, de fato, justamente devido à dificuldade de materializá-lo em palavras. Ou talvez porque caibam tantas palavras que, por mais que sejamos prolixos, sempre faltará algo. Mas a tal leveza de espírito é ação, é existência material, é tão concreta quanto esta tela de computador ou esta folha de papel. A atmosfera na qual ocorre um processo de seleção é naturalmente tensa. Seleção nada mais é que avaliação. Avaliar é atribuir valor. É atribuir valor a coisas muito pessoais, individuais, subjetivas até. Num processo mais tradicional, há duas pessoas numa sala: um que entrevista (que avalia) e outro que é entrevistado (avaliado). Por mais descontraído que seja, trata-se de um momento que sempre carrega alguma tensão, algum desconforto, sobretudo para o candidato. Alguém está "dando notas", atribuindo valor às minhas competências, às minhas atitudes, aos aspectos da minha subjetividade e, inevitavelmente, aos meus princípios pessoais.
Leveza de espírito. Demonstrar interesse pelo candidato e suas histórias. Surpreender-se. Frustrar-se junto com ele. Sentir e pressentir. Sorrir com facilidade. Refletir suas expressões. Compreensão antes de explicação. Não se deixar seqüestrar por preconceitos, mas deixar "em cima da mesa" suas intuições.
Pois é: "deixar em cima da mesa" suas intuições. Não adianta, ainda que vivamos numa sociedade que nos petrifica, ainda somos humanos (não sei até quando, mas ainda somos...). Pressentimento, intuição, fenômenos que, inevitavelmente, fazem parte da nossa relação com o mundo. E, sobretudo, nas relações humanas. Há aqueles que nos dizem para jogar fora os pressentimentos e as intuições, como se estas coisas fossem algum tipo de fraqueza; como se as coisas que pressinto e intuo de nada servissem, pois a verdade deve vir tão somente da racionalidade, da técnica, do método.
Sei não. Tenho medo das certezas. Defendo que a intuição é legítima. Num processo de seleção, assim como em todas as relações humanas, ela está presente e deve fazer parte do conjunto das nossas conclusões. Há de se tomar muito cuidado para não utilizá-la como pretexto que justifica preconceitos. Por isto, conclamo: leveza de espírito. Preconceito é um negócio pesado. Afunda como âncora e nos deixa imóveis, amargos, míopes. Nada disso tem a ver com a intuição.
O que sinto e pressinto de meu candidato deve ser levado em conta, porque antes de ser profissional, sou gente. Antes do teste e da entrevista, tem meu olhar. E tudo isto em seu conjunto, em sua inter (e intra) relação, ao final do processo, forma um retrato falado daquele candidato. Sim, retrato falado: uma tentativa de ilustrar a face de alguém. Algumas coisas são certas. Outras são erradas. Mas enfim, um retrato - ainda que falado - precisa ser feito. Mas é ilusão pensarmos que para fazer este retrato é necessário somente o aprimoramento técnico. Seleção envolve necessariamente relação humana. E um melhoramento efetivo só ocorre, de fato, com um melhoramento afetivo: o profissional de seleção tem que gostar de pessoas.

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